Visita a Iturama

Há tempos que os espíritas de Iturama convidavam Chico para conhecer a cidade. O médium prometia fazê-lo, porém, em ocasião propícia.

Localizada no Triângulo Mineiro, Iturama fica próxima à região noroeste do estado de São Paulo, recebendo desta o influxo do progresso pelas novas terras desbravadas.

Dona Carmelita, residente naquela cidade e amiga do médium, certo dia foi a Uberaba e formalizou o convite a Chico para a inauguração do centro espírita que fundara.

Ela viera com uma receita de Dr. Bezerra, amarelecida pelo tempo, e a exibia ao médium, que a recebera há muitos anos. Na ocasião ela havia dito que, se ficasse curada do mal que a afligia, fundaria um centro em Iturama e Chico lhe prometera que iria à sua inauguração.

Chico não pôde declinar daquele convite e acertou que estaria lá no dia marcado: 23 de fevereiro de 1976.

Por estar a aludida cidade em região limítrofe à nossa, também fomos convidados e para lá rumamos para assistir às festividades, que se dariam naquele dia, e rever o médium.

Tentemos situar o leitor que vive distante daquelas plagas. Para tal, torna-se necessário lembrar que o progresso chegou um tanto atropelado a diversos rincões do Triângulo, onde as cidades dormitavam nos antigos hábitos da centenária pecuária ali praticada, sendo esta o principal meio de subsistência de seus habitantes.

A religião católica, adotada pela esmagadora maioria da população, era ainda voltada às crenças locais, dando ênfase às festas comemorativas, nas quais aconteciam os encontros sociais.

E os espíritas, oriundos daquela gente, procuravam adaptar como podiam suas novas convicções àqueles costumes, para que não se mostrassem estranhos dentro da hospitaleira comunidade a que pertenciam.

Feitas estas observações voltemos ao encontro que tivemos com o Chico, nas condições previstas.

Desde sua chegada, uma multidão cercou o médium para cumprimentá-lo, conversar, fazer apresentações, tudo enfim, numa espécie de tumulto, que o deixou um tanto atordoado.

Mesmo assim, rodeado pelos amigos mais chegados e protegido mais de perto pela Espiritualidade, Chico, ao iniciar-se a reunião de inauguração, pediu-me que lesse e comentasse um trecho de O Evangelho Segundo o Espiritismo.

Contudo, não conseguíamos chamar a atenção do pessoal que extravasava o acanhado espaço do centro. Muitas pessoas, desligadas do que se passava, principalmente aquelas do lado de fora, continuavam a prosear.

Sem podermos dar início à leitura, subimos numa cadeira e ficamos aguardando o silêncio que não se fazia. Chico então resolveu, ele mesmo, subir na cadeira para tornar-se visível à maioria dos presentes.

O interessante e emocionante veio a seguir:

Olhando a multidão com seu magnetismo sublimado, ele começou:

— Meus amigos, estamos reunidos nesta noite (as conversas foram diminuindo) porque temos saudades de Jesus!…

Pairou sobre o ambiente poderosa e indescritível vibração, que a todos comoveu.

O fenômeno lembrava as narrativas das primeiras reuniões cristãs, em que a voz dos pregadores era ouvida por todos, ajudados que eram pelos espíritos que se utilizavam da mediunidade de efeitos físicos através daqueles que a possuíam.

Algo semelhante acontecera naquela noite em Iturama.

Depois da breve saudação, houve um momento propício à psicografia. No ambiente, que se mantinha em silêncio, Chico recebeu um poema, leu-o, e em seguida entregou-o a Dona Carmelita.

Maria Dolores assinara a página recebida, dando-lhe o título de “Luz no Caminho”, em alusão ao nome do centro que estava sendo inaugurado.

Uma enorme fila se formara para os abraços individuais ao médium.

Cada pessoa que o cumprimentava recebia uma rosa.

Muitos maços haviam sido providenciados, porém, como não bastassem, os moradores começaram a trazer flores cortadas de suas latadas e arbustos. Até palmas foram retiradas de coqueiros para que ninguém ficasse sem uma lembrança das mãos do médium naquela inesquecível e cálida noite de verão.

Ao terminar a reunião, o médium se despede da multidão dizendo:

— Amém, Jesus!

Ficamos intrigado com aquele “amém, Jesus”. Tempos depois, em Uberaba, perguntamos ao Chico porque ele usara tal expressão naquele encontro.

Ao que ele respondeu:

— Romeu, você observou o ambiente em que nos encontrávamos? A grande maioria dos presentes era católica. Eu não poderia terminar de outra forma para agradecer tanta gentileza e carinho naquela recepção…

 

(Do livro Inesquecível Chico – Romeu Grisi/Gerson Sestini – Ed. GEEM)